Mantendo os trabalhadores no jogo

Do Valor Econômico – 14/05/2019

Por Laura Tyson e Lenny Mendonça

Embora a taxa de desemprego e os pedidos de seguro-desemprego sejam atualmente inferiores aos observados em qualquer ponto desde 1969, a economia dos Estados Unidos ainda enfrenta desafios no mercado de trabalho que não podem ser ignorados. Um deles se destaca: a queda de longo prazo da taxa de participação na força de trabalho (LFPR, nas iniciais em inglês) – um fator fundamental para o crescimento futuro. No fim da década de 1960, 97% de todos os homens em idade ativa ideal (dos 25 aos 54 anos) participavam da força de trabalho, mas em 2018 sua participação caiu para 89%, puxada pela retração da participação na força de trabalho dos homens sem ensino superior.

No mesmo sentido, após elevações sistemáticas, a taxa de participação das mulheres em idade ativa ideal alcançou seu pico de 77% em 1997, estagnou até 2000, caiu durante a Grande Recessão e se recuperou ligeiramente após 2015, registrando 75% em 2018. Essas tendências nos EUA diferem das observadas em outras economias industrializadas avançadas.

Por exemplo, usando um grupo etário mais amplo (dos 15 aos 64 anos), a LFPR masculina se estabilizou no Canadá e no Reino Unido, após cair entre 1990 e 2000, enquanto se reduziu ainda mais nos EUA. As tendências da LFPR feminina também variaram entre os países. Usando essa medida mais ampla, a taxa de participação feminina nos EUA alcançou o pico de 70% em 1997 e caíra para 67% em 2018.

No Canadá e Reino Unido aumentaram gradualmente desde a década de 1990. A queda da participação na força de trabalho não se reproduz por igual na força de trabalho. Varia não apenas por gênero e por idade como também por grau de instrução e localização geográfica, refletindo uma série de fatores, entre os quais as condições macroeconômicas, a automação, a taxa de encarceramento e a dependência de opioides.

O desafio nos EUA à oferta de mão de obra é ainda mais complicado pelas diferenças entre meio rural e urbano. Como abrigo de grandes empregadores institucionais, as cidades tendem a ter desemprego menor, crescimento populacional maior e forças de trabalho de maior instrução. Em contraposição, em muitas cidades pequenas e áreas rurais, as populações estão envelhecendo e, em mais de 50% dos condados americanos, estão encolhendo. Entre 1963 e 2017, a parcela dos trabalhadores americanos com diploma de curso superior ou de pós-graduação subiu de 12% para 39%, e a parcela dos que possuem diploma do ensino médio ou de níveis inferiores caiu de 75% para 33%. Mas este último grupo sofre de taxas mais elevadas de desemprego, de menor LFPR e de renda inferior em comparação a seus colegas de maior escolaridade.

Em vista dessas diferenças demográficas, a diretoria regional do Federal Reserve de Richmond estima que, ao focar em mulheres, trabalhadores sem ensino superior e americanos do meio rural, os EUA poderiam agregar mais de 18 milhões de pessoas à força de trabalho. Por exemplo, se os EUA elevassem sua LFPR feminina até equipará-la à do Canadá (onde há licença maternidade e paternidade remuneradas, creches financeiramente acessíveis e benefícios/incentivos fiscais para progenitores e cuidadores facilitam para as mulheres a tarefa de trabalhar em período integral), a oferta americana seria acrescida de 5,2 milhões de trabalhadores.

No mesmo sentido, a redução das discrepâncias de grau de instrução poderia reforçar a oferta de mão de obra com mais 10 milhões de pessoas. A taxa de desemprego dos trabalhadores com diploma do curso médio corresponde a quase o dobro da dos formados no ensino superior. Mas até 2025 dois terços de todos os postos de trabalho exigirão um nível de escolaridade superior ao ensino médio. Finalmente, ao elevar a relação emprego em idade ideal sobre população nos condados rurais até o nível das grandes áreas metropolitanas, os EUA poderiam agregar 3,5 milhões de pessoas à oferta de mão de obra. Uma das propostas que merecem ser examinadas é usar incentivos e outros benefícios fiscais para atrair empreendedores e empresas para as áreas rurais. Mas aumentar a LFPR levará os EUA apenas até aqui. O presidente Donald Trump pode não gostar disso, mas os EUA precisarão de mais imigração legal.

Nunca é demais enfatizar o papel decisivo que os imigrantes desempenharão no crescimento futuro dos EUA. No ano fiscal 2017-2018, 10% dos condados americanos que registraram crescimento populacional o fizeram devido à imigração. Outro requisito para atender às exigências futuras do mercado de trabalho é a requalificação. Na medida em que a automação se torna um componente cada vez mais importante do crescimento da economia, os trabalhadores empregados em funções manuais de rotina e cognitivas ficarão mais vulneráveis à dispensa. Serão necessários novos programas de seguro social para ajudá-los a adquirir novas qualificações, e os atuais benefícios devem ter sua portabilidade garantida a fim de seguir os trabalhadores de um emprego a outro. Um bom modelo é o programa SkillsFuture, de Cingapura, que dá a cada cidadão acesso a programas individualizados de requalificação, e aumenta os incentivos fiscais e outros benefícios na medida em que os trabalhadores envelhecem.

Nos EUA, os formuladores de políticas públicas de todos os níveis podem ajudar tanto os trabalhadores quanto as empresas ao fornecer incentivos fiscais para investir em treinamento de funcionários, expansão de programas de estágio, e para apoiar os avanços na carreira e os programas de treinamento inovadores. Na Califórnia, por exemplo, o governador Gavin Newsom (a quem Lenny Mendonça presta assessoria) está desenvolvendo uma estratégia abrangente para aprimorar a qualificação da diversificada força de trabalho do Estado. O governo tem em mente implantar um sistema educacional do berço à carreira que oferecerá dois anos de faculdade comunitária gratuita e 500 mil vagas de estágio, em que “se aprende e se ganha”, até 2029. Newsom pretende também formar uma nova comissão sobre o futuro do trabalho, por meio da qual dirigentes do governo, trabalhistas e empresariais examinarão soluções para os desafios à oferta de trabalho discutidos acima. O que está em questão não é apenas “o futuro do trabalho”, e sim o futuro das pessoas e de seus meios de vida. Desenvolver as qualificações necessárias para o mercado de trabalho do século XXI é a maneira mais eficiente de fomentar o crescimento, enfrentar as desigualdades e gerar prosperidade significativa para todos.

(Tradução de Rachel Warszawski)

Laura Tyson, ex-presidente do Conselho de Assessores Econômicos do
Presidente dos EUA, é professora da Haas School of Business na Universidade da Califórnia, e
assessora sênior do Rock Creek Group. Lenny Mendonça é presidente do conselho de administração da New America, e assessor­-chefe de economia e negócios do Estado da Califórnia. Copyright: Project Syndicate, 2019.

 

 

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